8 de agosto de 2007

Mais reflexões

Hoje pus-me a pensar que, para que duas pessoas estejam apaixonadas, não basta aquilo que cada uma é, mas é muito importante aquilo que acontece entre elas, a teia de acontecimentos que se gera. Se calhar o Romeu e a Julieta não se teriam apaixonado se os acontecimentos que rodearam a sua história tivessem sido outros. Uma amiga minha diz que tem que haver qualquer coisa de inesperado, tipo encontrarem-se por coincidência duas vezes ou mais, como se houvesse uma espécie de aprovação por parte do acaso.

Não controlamos as coisas, não podemos dizer "vou-me apaixonar por aquela pessoa naquele momento", só podemos saber reconhecer a pessoa e o momento e atirarmo-nos de cabeça quando os sentirmos. Isto faz pensar que as coisas já existem em potência dentro de nós, e que são despoletadas pelas condições exteriores certas. É engraçado, há condições exteriores que puxam por nós e por aquilo que nós somos mais profundamente, e que nessas situações vem ao de cima (agora já não estou a falar só de paixões). Neste sentido, a manifestação de quem nós somos está dependente de condições exteriores específicas que façam emergir as nossas reacções mais verdadeiras.

Por outro lado, nós também influenciamos as condições exteriores com as nossas reacções, numa relação recíproca de influências (isto também vem na linha da última reflexão). Muitos de nós temos gritos interiores a quererem saír, emoções e sentimentos relativos a coisas específicas que não saem por não se ter gerado a situação certa que despoletaria essa exteriorização. Um exemplo típico disso, infelizmente pela negativa, é quando percebemos que gostamos de alguém e que queríamos tê-lo dito, depois da pessoa ter desaparecido da nossa vida. O grito "gosto de ti" estava lá dentro, mas a situação que proporcionou a emergência desse grito veio tarde demais.

Tudo isto está relacionado com a discrepância ou não que pode haver entre o nosso interior (a nossa identidade) e o que se passa ao nível da acção, das experiências que vivemos todos os dias. Acho que o ideal é que não haja essa discrepância, e que a nossa identidade esteja totalmente representada nas nossas experiências. Que aquilo que nós somos em potência se manifeste na realidade. Para isto, é preciso implicarmo-nos nas nossas acções, reagirmos sempre do fundo do nosso coração, encontrarmos a seriedade dentro de nós, aquilo que nos importa, e reagir sempre aos acontecimentos com as atitudes que mais nos representam.

Certas pessoas, em certas épocas, vivem vidas em que esta relação recíproca entre as coisas que lhes acontecem e as reacções que têm perante os acontecimentos é tão afinada, tão autêntica, tão exteriorizada, que atingem um estado extremo de definição da sua identidade, de tal maneira que não se imagina que fosse possível terem sido diferentes do que foram, ou de terem tido outra vida. É realizante para o Homem concretizar através de reacções reais aquilo que sente por dentro, e que muitas vezes nem percebe que o sente.

Afinar a nossa relação com a vida, procurando estar nas situações que nos dizem realmente respeito, e reagindo com aquilo que somos realmente, é muito importante. Voltando ao tema das paixões, acho que quem vive assim reconhece mais facilmente a pessoa e o momento certo e tem menos desilusões.

4 comentários:

eyeshut disse...

este texo dava pano para mangas!!!!!

por isso, fico-me por uma ideia que me ocorreu, ao lê-lo. aquela do Ortega quando distingue "aquilo que fazemos daquilo que nos acontece". nunca esqueci esta frase. porque a acho bonita. e não só bonita, mas poética. e não só poética, mas verdadeira.



p.s. essa coisa das paixões tem muito que selhe diga, também.
exemplo altamente ridículo, mas verdadeiro: neste momento, o meu pai (portista ferrenho) está a ver o Pinto da Costa na televisão, em directo, a falar da Carolina... se eu entrar na sala e disser que me caiu o tecto do quarto (note-se que eu tenho o pai-galinha mais galinha do mundo), ele nem me vai ouvir. está hipnotizado pelo timbre do Pinto da Costa.
paixões...!!!:))

eyeshut disse...

eu e os p.s. ortográficos!!!

"texto"

"se lhe"

- disse...

olá! obrigado, gosto de coisas bonitas, poéticas e verdadeiras :)

quanto ao p.s. ortográfico, é o q dá escreveres de olhos fechados... lol

e de certeza q o teu pai-galinha gosta mais do teu timbre do que do pinto da costa! ;)

eyeshut disse...

escrever de olhos fechados? lol muito bem visto! :))